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Pronunciamento do Presidente da FIEC, Dr. José Flávio Costa Lima, no transcurso do Dia da Indústria e entrega da Medalha do Mérito Industrial.
Fortaleza, 24 de maio de 1985



De tanto repetido e comprovado tornou-se cediço afirmar-se que um povo reflete a personalidade dos cidadãos que o compõe.

Da Antigüidade oriental Confúcio nos ensina outra lição de caráter sociológico quando afirma que “o homem forma a família; a família conforma a aldeia; a aldeia delineia a cidade...” e assim sucessivamente passando pelas mesmas comunas, pelos cantões, pelas regiões e pelos Estados para desaguar nos países e, por conseqüência, nas nações.

A sabedoria popular manipula essas premissas ensinadas pela vida e sintetiza toda essa perquirição político-filosófica concluindo de forma definitiva que “o povo tem o governo que merece”.

Se tudo isso é verdade nós os cidadãos brasileiros devemos rezar o “mea culpa”.

Por muitas e muitas vezes tivemos oportunidades de ordenar a Nação e o estado brasileiros para a satisfação de nossas ansiedades e esperanças urgentes.

E em todas elas nos faltou personalidade, competência, persistência e obstinação para conseguir o objetivo visado.

A Nova República que herdamos de Tancredo Neves não é inédita.

Antes dela muitas outras Velhas Repúblicas foram destronadas (e o paradoxo é intencional) somente para nos permitir nova condução da “re publica”.

A vez que agora se nos é oferecida surgiu pela ação de quase todos os seguimentos da sociedade brasileira.

Para seu levantamento, sobre um regime de exceção, contribuíram todos os setores da comunidade, até mesmo aqueles que detendo o poder da força, perceberam que o momento histórico exigia mudança e decisão.

Os empresários industriais também contribuíram e basta lembrar a corajosa edição do célebre documento dos 8 sem dúvida o primeiro documento de oposição formal à República Velha e a primeira afirmação da necessidade de rever a estrutura política de 1964.

E não há o que admirar nessa posição do industrial brasileiro.

Ele sempre foi um participante e um vigilante cidadão disposto a não se deixar enquadrar unicamente entre as fronteiras de suas atividades profissionais.

A comemoração desta noite é bem um exemplo claro dessa verdade.

Aqui estamos homenageando Hermano Franck o industrial. Mas não esqueçamos o pioneiro do tempo em que o investimento maior era a coragem e a interferência do Estado se limitava à cobrança do imposto sobre o lucro, a ser teoricamente distribuído em benefício da sociedade. Nessa paisagem de desestímulo e abandono é que Hermano plantou uma das primeiras sementes da mineração do Ceará e o fez com tão longa visão e determinado tirocínio que sua obra ainda hoje aí está lhe honrando a memória e o nome de industrial trabalhador e honesto.

Aqui também estamos louvando Adalberto Benevides Magalhães um jovem industrial de 82 anos, altivo de corpo e de alma, pois a firmeza de seu comportamento e a dedicação aos seus objetivos fizeram brotar para ele a fonte da juventude. Juventude que não mal barata nas queixas ou nos lamentos, antes o leva a enfrentar tropeços e insucessos com a têmpera dos homens que sabem o que querem e nunca atingem seus objetivos pois eles se renovam a cada nova conquista, realimentando sua sede de fazer e de produzir para a sociedade.

Sua obra aí está, ensinando, pelo exemplo dignificante, que o trabalho e a paz é que são os instrumentos da prosperidade e do desenvolvimento sadios.

E fechando a generosa e rica lista dos nossos homenageados desta noite citamos Moysés Pimentel também um bravo industrial. Desses bravos industriais que não bebem somente o néctar das vitórias, mas amargam também o fel do insucesso com a sobrançaria dos fortes e o aprumo dos que são dignos. E quando, afinal, conquista a tranqüilidade, não aceita o rótulo de “homem realizado” e parte em busca de outras atividades. Assim o fez Moysés Pimentel: as atividades de industrial não bastaram para sua aspiração de se dar e se extravasou na política, sofrendo ferimentos em duras batalhas que antes de deformá-lo o galhardeiam com cicatrizes que só ostentam os bons cidadãos.

           

Meus senhores, minhas senhoras, companheiros empresários.

Os três agraciados, cujos méritos apenas foram esboçados, compõem com exatidão o perfil do industrial consciente, também um legítimo cidadão brasileiro.

Sua presença no momento político nacional está assinalada e essa afirmativa, longe de ser um pedido de gratidão, louva minhas ou aplausos, é uma declaração de compromisso.

A indagação sobre o futuro do país faz parte de sua meditação do dia-a-dia.

Quando a nação vivia o drama da agonia de Tancredo Neves, o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará, José Flávio Costa Lima, perguntava a seus pares: “Com quem contaremos no Day After?”

Era a preocupação e o temor de que talvez a inexperiência e o êxtase diante do uso da liberdade tão largamente sonhada e afinal conquistada, levasse nossa sociedade a anulação, ou ao naufrágio da construção política não da Nova República, mas do Novo Brasil.

Estamos vivendo o dia depois.

E não é pessimismo falar das apreensões que se alevantam no nossos horizontes.

A quebra súbita daquele desejo de pensarmos juntos, de procurarmos entendimento e consenso, de sermos tolerantes e compreensivos, nos levam a posições de confronto e de impertinência.

Recusamo-nos, todos, a dar ao governo, que se instalou por nossa vontade, a carência para que nos pague o empréstimo que lhe fizemos do nosso apoio e da nossa solidariedade.

Durante muitos anos, em nome do bem estar do país, aceitamos em silêncio e quase sem protesto os erros que nos foram impostos e de cujos efeitos ainda hoje somos herdeiros.

Hoje temos nas mãos os instrumentos para corrigi-los e que são acima de quaisquer outros o direito de criticar e de reivindicar.

O governo que instalamos sabe disso.

Mas é ao cidadão de qualquer atividade que cabe não esquecer as dolorosas experiências já vividas e nunca permitir que sejamos conduzidos para extremismos de qualquer cor ou feição.

Temos uma tarefa nova a cumprir.

Sem paciência para com aqueles que reivindicam; sem mostrar a quem reivindica que o açodamento e o exagero nunca produzem bons frutos, ela não será realizada.

Os instrumentais cearenses, mais do que qualquer um, temos uma larga e abnegada experiência para oferecer àqueles que se perdem nos caminhos da insensatez e da impaciência.

Ninguém no país recebeu menos cuidado e mais desatenção do que nós.

Ainda agora nos angustiamos com uma possível extinção do FINOR e é certo que pelo menos aquele incentivo fiscal sofrerá alterações na sua estrutura.

Contra isso já nos pomos em alerta e em posição de combate.

Mas não será a defesa dos interesses da região nordestina que nos fará esquecer nosso comprometimento maior com o futuro do país.

Sem economia organizada, nascida da associação do capital convenientemente remunerado e do trabalho pago com equidade, nenhuma sociedade terá solidez  ou alcançará desenvolvimento estável e justo.

Nossa mensagem é a de administrar os conflitos com sapiência e em outro rumo que não seja o da exacerbação.

Só juntos, alcançaremos a paz para o trabalho fecundo e de tal modo abundante que possa ser distribuído com toda a sociedade.

O dia depois já não é o de Tancredo.

O dia depois será de amanhã.

E nós seremos os responsáveis pelas suas conseqüências boas ou más.

Os industriais do Ceará as querem boas, e não conhecemos outro caminho para buscá-las senão o do entendimento, senão o da tolerância, com o mais amplo e integral respeito ao direito e a lei.

Sem lei e sem direito está a nossa espera, de novo, o governo, que merecemos.

Para que tal não aconteça os industriais cearenses reafirmam sua crença e seu apoio à livre empresa e ao Estado democrático.